Numa data especial o soldado Jéferson Alves, 33 anos, então da 58ª CIPM
(Cosme de Farias), apontava uma pistola para a própria cabeça enquanto
as mães de todo o Brasil recebiam rosas vermelhas e outros mimos.
A sua
talvez o esperasse para o almoço naquele domingo, 12 de maio deste ano.
Sentado na cama, Jéferson ainda conversou com alguém ao celular antes de
apertar o gatilho.
A PM perdia mais um dos seus homens. Não para o
crime, mas para ela própria. E assim foi com o capitão Alexsander
Valério Ferreira, 38, da 15ª CIPM (Itapuã), que também se matou em sua
casa, neste caso por envenenamento, no dia 9 de junho; e com o soldado
Aloísio Santos da Rocha, do Departamento de Planejamento, que atirou
contra a própria cabeça no primeiro sábado deste mês.
Os três suicídios
de policiais em 2013 até alarmam a Polícia Militar, já que, de acordo
com números não oficiais, a média é de dois ao longo de um ano. Mas,
pior que as histórias por trás dos suicídios é a constatação de que elas
são apenas a consequência trágica de um problema muito maior. Dados do
Centro de Perícias Médicas Militares (CPMM), aos quais o CORREIO teve
acesso, mostram que, entre 2008 e 2012, a PM registrou 184 afastamentos
definitivos e temporários.
Destes, mais de 40% (77) estão relacionados
com transtornos mentais e de comportamento. Os casos de síndrome do
pânico, tensão pós-trauma, transtornos compulsivos e, como no caso de
Jéferson, depressão, se multiplicam e são cada vez mais comuns. Pelo
menos cinco policiais militares que tentaram suicídio estão atualmente
em tratamento no Serviço de Valorização Profissional (Sevap),
responsável pelos atendimentos psicológicos na PM.
A família de Jéferson
prefere não falar. Mas amigos e colegas de farda estão certos de que
foi a rotina da polícia que o fez cometer suicídio. “Depois que virou PM
entrou em depressão. Se isolou, deixou de ser aquele cara alegre”,
narrou uma amiga bem próxima. “Não aguentou a pressão e não teve ninguém
dentro da polícia que evitasse a tragédia”, disse um colega
soldado. Resultado do dia a dia de violência que Jéferson enfrentava, o
Sevap realizou, somente em 2012, 1,4 mil atendimentos — sendo 123 casos
encaminhados para o setor de psicologia.
Entre os psicólogos do órgão há
um sentimento comum de que a demanda é grande demais para o tamanho da
estrutura. “A quantidade de profissionais não comporta. São casos
difíceis e crônicos, que duram quatro, cinco meses de tratamento”,
afirmou o major Antônio Honorato Barbosa, que assumiu a coordenação do
Sevap há cerca de dois meses. “Por isso, nossa prioridade é sanar as
demandas organizacionais. Mandar o policial para a clínica só em último
caso”, admite.
Nos números não estão contabilizados os 27
encaminhamentos para atendimentos psiquiátricos em instituições
externas. São os casos mais graves. Já que não existes psiquiatras na
PM, eles são levados para locais como o Núcleo de Atendimento
Psicológico (Nead), da Secretaria da Segurança Pública (SSP), Sanatório
São Paulo e algumas fundações. “Na medida do possível, vamos encaixando
esses policiais nestas instituições. Às vezes, até pela amizade”,
explica o major Honorato.
De todos, o Sanatório São Paulo é o único com
capacidade de internação. “Aqui são comuns pacientes da polícia. São
casos e mais casos de policiais internados ou que frequentam o
hospital-dia”, afirma, sem se identificar, uma funcionária do sanatório,
hoje conhecido como Espaço Nelson Pires. “O excesso do Nelson Pires
existe porque eles são a única opção”, confirma major Honorato.
Procurado pelo CORREIO, o sanatório recusou-se a divulgar o número de
pacientes atendidos.
Os distúrbios psicológicos são um problema não só
crescente, mas antigo dentro da PM. Um estudo de conclusão do mestrado
pela Ufba, do psicólogo Robson Souza, mostra que o problema é grave pelo
menos desde o início desta década. A partir de registros do CPMM, no
período compreendido entre 2001 e outubro de 2008, foram avaliados como
definitivamente incapazes para a atividade profissional, em razão de
transtornos mentais e comportamentais, 295 policiais
militares. (Correio)
Comentários
Postar um comentário